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Espiritualidade sem religião é possível?

 Antes de qualquer coisa, devemos entender que religião é tradição, é ouvir a sabedoria dos nossos antepassados, é aprender com os erros daqueles que já trilharam o mesmo caminho que estamos trilhando agora.
 Podemos cultivar uma espiritualidade sem uma religião que a sustente, podemos inclusive cultivar uma espiritualidade sem Deus, mas o que a experiência nos mostra é que as pessoas que possuem uma religião e a praticam conseguem desenvolver muito mais facilmente a sua espiritualidade.
 De um modo geral, as pessoas mais espiritualizadas são as religiosas, pois estas seguem preceitos e orientações, dedicando a sua vida a uma contínua busca pelo aprimoramento próprio. Quando o indivíduo abandona a religião e tenta ele mesmo cultivar essa espiritualidade ao seu modo, ele acaba geralmente afrouxando o seu compromisso pessoal com a sua própria melhoria – antes a pessoa tinha que ser melhor porque Deus queria, agora ela precisa ser melhor pelo simples fato de que quer ser melhor (e sabemos muito bem como somos autoindulgentes quando dependemos somente de nós mesmos).
 Na famosa frase de Dostoiévski: "Se Deus não existe, tudo é permitido", temos, de um lado, o arcabouço moral de uma tradição milenar a nos orientar e, de outro lado, o homem abandonando a sua história, o seu passado, decidindo por si mesmo o que é certo e errado. Eis o dilema: seguir a trilha demarcada por aqueles que vieram antes de nós ou abrir a golpes de facão um novo caminho?
 Espiritualidade (sem religião) é trilhar o próprio caminho, sozinho. E sozinho é bem mais fácil se perder. É claro que podemos alcançar ótimos resultados sem nenhum auxílio externo, demorará mais tempo, maiores serão os obstáculos, mas os resultados também poderão ser muito satisfatórios. Cada um escolhe o seu próprio caminho: vencer somente às custas do próprio mérito é muito honroso; vencer utilizando ferramentas, métodos e a sabedoria acumulada de séculos não é nem um pouco vergonhoso.


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