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Mostrando postagens de maio, 2021

À procura de um poema

Às vezes rimo, às vezes não rimo, e logo depois me vejo correndo descalço pelos campos da meninice, afagando sonhos e versos, polinizando amorosas flores. Aos meus pés, uma planta pequenina, frágil como tudo aquilo que há de mais bonito nesta vida, que cresce, cresce, cresce e se torna árvore sem medo, em cuja sombra me calo e envelheço. À noite, quando os pássaros voltam aos seus ninhos, quando frio se faz presente, tento recordar uma velha cantiga de viver; e eis que o tempo, a vida, tudo, de repente, se transforma em água, salobra, calma, lúcida; e eu, pobre criança mergulhada no mistério, me transubstancio também em Mar Absoluto.

Relicário

Palavras ao vento, perdidas no tempo; resquícios e relíquias de almas que não se encontram, de vidas que não se cruzam. Palavras de desalento e desencanto, ferinas, amargas, sinônimas de cicatriz, dor e pranto. Palavras sussurradas ao pé do ouvido, com carinho e cuidado, que reverberam nos sedentos corações. Palavras secretas, inconfessáveis, guardadas a sete chaves. Palavras de gratidão e prece, inaudíveis, transcendentes. Palavras e seus significados semânticos e românticos. Palavras: Caos e Silêncio.

Saudade

Não há mais o que dizer, fazer; dor, saudade e luto se misturam com a perplexidade deste momento. Mês de maio, frio, chuva, silêncio... Ainda ontem você estava aqui, simples e amável, me ensinando as coisas da vida. Ainda ontem você me embalava com canções de carinho e aconchego. Hoje meus olhos estão embaçados, meus dedos, trêmulos, minha vida, triste. *** O vento da estação sopra mais uma vez, e tudo parece tão igual – quase normal –, as mesmas pessoas, as mesmas ruas, e as mesmas conversas. Tudo tão igual...

As marés da vida

Minhas palavras se evaporam Meus pensamentos se diluem Mergulho cada vez mais fundo Miro a última ilusão desfeita Maldigo paixões arrefecidas Mastros e velas destruídas Naufrágio além do horizonte Nebulosas memórias e tempestades Nítidas angústias ao vento do norte Nada, porém, que me faça desistir Ondas, fluxo, vida e calmaria O tempo e amor restantes.

Canteiros

Eras tu ontem – não poderia ser mais ninguém –, seguindo os meus passos, revolucionando a minha realidade. *** Estás nos devaneios que tenho, nos pobres versos que aqui despejo, nas alamedas e canteiros do meu labiríntico coração. Vejo-te em tudo, mas nunca diretamente, nunca tête-à-tête. *** És a folha ao vento no outono, o canto da ave liberta na primavera, o brilho de um olhar que transcende qualquer estação. És ritmo, passagem, tempo: aurora e crepúsculo. som e silêncio.

Frente e Verso

Versos que componho, decomponho, e que me rasgam a pele. Versos, sim, dilacerantes, delirantes, que brotam dos rochedos, dos ermos sítios da solidão. Versos que gritam e se evaporam na noite silenciosa do mundo. E no baço espelho da vida, uma estranha face, uma quimérica imagem, um vulto desesperançado. Seja na frente ou no verso: páginas e páginas cobertas por uma prosa antipoética cheia de rabiscos, vozes e palavras desconexas.

Soneto de Recordação

Um banco, uma praça, em uma tarde dourada, eis que te vejo do nada, com luz, perfume e graça. *** Uma memória emoldurada: uma conversa que enlaça; pássaros a fazer arruaça; vida, sinais e uma nova florada. *** De tudo, o que fica é a saudade, que cresce sempre à tardinha, lânguida, contida e evanescente. *** Cresci nesta simpática cidade, – com sua grama bem cortadinha –, contemplando o mesmo sol poente.

O inverno chegou!

O inverno chegou, mas não como prenúncio de morte, e sim como introspectivo consorte, taciturno companheiro de clausura. Eis um tempo de reflexão, onde o frio nos pega pela mão e nos leva rumo ao abismo do que somos. Sim, o inverno chegou, e aqui chegamos nós também, cegos diante de tanta luz, tentando achar alguma resposta, alguma saída. E, na transitoriedade de todas as coisas, para aqueles que não fogem da estação, o que fica mesmo é um profundo respeito pela vida.

Poeminha contraditório

Quero escrever um poeminha à toa, um poeminha vagabundo, desses que não dizem nada, que estão aí só por estar, sem pretensão alguma, sem razão de ser: – Que poeminha bom é estar junto a você! –

Um pouco mais de poesia

A vida pode ser mais do que isso, mais do que dores e cansaço, mais do que política e descaso. Há de haver um compromisso, uma vontade de fazer diferente, de não ser como toda essa gente que só faz o que é preciso. Está mais do que na hora de vivenciar a poesia, esta  linda ave canora , à luz do dia a dia. E para além das palavras, um aroma doce e suave, uma canção sempiterna e um desejo de encontro.

Humor citadino

Hoje eu caminhei pela cidade: dores escondidas em cada esquina, solidões anônimas nos bancos da praça, jardins da vida ressecados, muros, grades, lanças e portões. Não quero ser poeta das coisas mortas; melhor dar mais uma volta.

Os pequenos sufocamentos do dia a dia

Taça de cristal despedaçada, flores murchas, móveis empoeirados, enfim, imagens do que restou. *** Eu mal consigo sentir qualquer gosto ou odor, e o ar ao meu redor parece rarefeito e indiferente; ah, os pequenos sufocamentos do dia a dia. *** Tento outra vez atravessar uma parede de ressentimentos e falta de amor. *** Espero um mais pouco, olho para todos os lados, e sinto a brisa suave da manhã em meu rosto, o cheiro da primavera em flor. *** O futuro não se mostra excitante, e o passado ruge como uma fugidia e capciosa lembrança. Tento não pensar em nada – sei que sou poeira ao vento –; quero apenas fincar os meus pés no possível, no palpável. 

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